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Cazuza: Álbum “Burguesia” completa 30 anos mostrando que o Brasil ainda precisa de muitas mudanças

“Burguesia”, “Perto do Fogo”, “Mulher sem Razão”, “Filho Único”, “Quase um Segundo” e “Como Já Dizia Djavan” são alguns dos hits

 

A música brasileira nos anos de 1980 revelou grandes bandas, como, Legião Urbana, Ultraje a Rigor, Capital Inicial, Paralamas do Sucesso, Nenhum de Nós, Plebe Rude, Engenheiros do Hawaii e etc. No entanto, nenhum desses grupos teve uma presença tão marcante na história da música quanto o cantor e compositor “Cazuza” que fez história no “Barão Vermelho” e uma carreira solo brilhante com cinco discos de estúdio e um ao vivo. Prova disso, é que mesmo depois de sua partida, Cazuza continua se mantendo cada vez mais atual no cotidiano brasileiro e seu álbum “Burguesia (1989)” que completou 30 anos de história é o retrato “fiel” de um país que pouco mudou de lá para cá.

 

O disco foi o último gravado por Cazuza e vendeu 250 mil cópias dando ao cantor o Prêmio Sharp póstumo de melhor canção com “Cobaias de Deus”. Com letras mais sociais e ligadas as questões cotidianas do país, “Burguesia (1989)”, foi gravado durante um período complicado da carreira de Cazuza, já que ele já se encontrava com poucas forças e já tomado pela AIDS. Mesmo com pouca energia até para ficar de pé, ele fez questão de estar todos os dias no estúdio para dar vida ao álbum que traz parcerias com nomes importantes da música, como, Frejat, Angela RoRô, Arnaldo Antunes, Rita Lee e demais artistas.

 

O álbum traz 20 faixas e algumas relíquias, como, a faixa “Burguesia” que faz uma análise perfeita sobre a chamada “Classe A”, que em sua visão na “época”, não se preocupava com o seu proximo e mais olhava para o próprio umbigo. “A burguesia fede. A burguesia quer ficar rica. Enquanto houver burguesia. Não vai haver poesia. A burguesia não tem charme nem é discreta. Com suas perucas de cabelos de boneca. A burguesia quer ser sócia do Country. A burguesia quer ir a New York fazer compras. Pobre de mim que vim do seio da burguesia. Sou rico mas não sou mesquinho. Eu também cheiro mal. Eu também cheiro mal”

 

Em seguida “Burguesia (1989)” traz “Nabucodonosor”. A letra também tem um teor mais forte e mostra que Cazuza estava mais ligado a sua família. “Nabuco foi um cara. Conheci no enterro. Que tinha um cavalo. Um cavalo chamado Agenor. Um cavalo chamado Agenor. Nabuco era matuto. Elegante e astuto. Assim como eu sou. E era também meu avô. E era também meu avô. Nabuco já morreu. Foi para o exterior. E hoje em dia sou eu. O anjo e o sedutor. O anjo e o sedutor”.

 

Com “Tudo é Amor” ele mantém a linha e mostra mais uma vez o seu olhar. “Um homem pode se afobar. E pegar o caminho errado. Homem que é homem volta atrás. Mas não se arrepende de nada. Sabe que a vida é pra lutar. Contra um dragão invisível. Que mata os sonhos mais banais. Que acha que é tudo impossível. Um homem que veio do pó. É o que transforma o pó em ouro. Um homem foi criado só. Mas vive em função do outro. Na natureza onde ele é rei. No universo onde não é nada. Na incerteza e no prazer. Na ilusão de ser amado”.

 

Na canção “Garota de Bauru”, Cazuza consegue nos transportar para o imaginário. Uma letra suave e ao mesmo tempo provocativa. “Eu conheci uma garota em Bauru. Quinze anos de vida e cinco de rebu. Na lanchonete principal era a rainha. Com suas minissaias sem bainha. Os pais choravam. Os irmãos ameaçavam. E ela nem aí, maravilhosa. Gostosa em sua vulgaridade. Feliz com sua sinceridade. A garota de Bauru. Não é um sanduíche. A garota de Bauru. A garota de Bauru. Não é um sanduíche. A garota de Bauru. Não é um personagem triste”.

 

Com a canção “Eu Agradeço”, Cazuza mais uma vez mostra os traços do poeta consciente. “Eu, eu agradeço, Senhor. Eu, eu agradeço, Senhor. Pois me criei. Esta criança que ei sempre hei de ser. Por outros seres e desejos. Vivos nas estrelas. Por ser um rei. E não ter que governar a vida. Agradeço por ter desobedecido. Por ter cuspido no teu altar sagrado. E por saber que nunca vou ter fé. E vou rir só com um canto da boca. Eu, eu agradeço, Senhor. Eu, eu agradeço, Senhor. Meu coração vai filtrar todo o ódio. Como um fígado. E vencer o ódio”.

 

Já com “Eu Quero Alguém”, “Babylonest” e “Como Já Dizia Djavan”, ele leva o álbum “Burguesia (1989)” na mesma sintonia e chega em “Perto do Fogo”, canção escrita por ele e por Rita Lee, que também foi gravada pela rainha do Rock em seu disco “Rita Lee (1990)”. A letra é estoteante e bem forte. Na verdade quase um prelúdio dos tempos atuais, já que a música fala do ano 2020. “Perto do fogo. Como faziam os hippies. Perto do fogo. Como na Idade Média. Eu quero queimar minha erva. Eu quero tá perto do fogo. Quando tudo explodir. Mas não vai explodir nada. Vão ficar os homens se olhando. Dizendo: “O momento está chegando”. 2000, é ano 2000. E não vai mudar nada. E não vai mudar nada”.

 

Com “Cobaias de Deus” e “Mulher sem Razão”, Cazuza ainda demonstra sua poesia e chega em “Quase um Segundo”, música de Herbert Viana (no Paralamas do Sucesso). Na música Cazuza mostra que o romântismo também fazia parte de seu vasto repertório. Na canção ele traz toda a sua interpretação e não se afasta muito da versão original. “Eu queria ver no escuro do mundo. Aonde está o que você quer. Pra me transformar no que te agrada. No que me faça ver. Quais são as cores e as coisas pra te prender. Eu tive um sonho ruim e acordei chorando. Por isso eu te liguei. Será que você ainda pensa em mim? Será que você ainda pensa? Ás vezes te odeio por quase um segundo. Depois te amo mais. Teus pêlos, teu gosto, teu rosto, tudo. Tudo que não me deixa em paz”.

 

O álbum ainda traz as magníficas “Filho Único”, “Preconceito”, “Esse Cara (de Caetano Veloso)”, “Azul e Amarelo”, “Cartão Postal”, “Manhatã”, “Bruma” e fecha incrivelmente com “Quando eu Estiver Cantando”.

 

Avaliação

 

Falar de Cazuza é satisfatório e ao mesmo tempo muito gratificante, pois conheci a sua obra musical na juventude e dali para frente me encantei com todos os seus discos e letras. “Burguesia (1989)” é o melhor retrato que temos de um país que realmente pouco mudou de lá para cá, seja na política quanto no cotidiano | social e mostra que ainda temos muito o que aprender. Entre as faixas que gosto e indico deixo: “Burguesia”, “Quase um Segundo”, “Como Já Dizia Djavan”, “Perto do Fogo”, “Filho Único” e “Mulher sem Razão”, que magistralmente foi gravada no final dos anos de 1990 por Adriana Calcanhoto. Avalio com cinco estrelas (máxima), pois mesmo sendo um álbum com vocal menos expressivo, mostra toda a força de vontade de Cazuza em deixar uma obra eterna e que nos faz pensar sobre nossas vidas e os rumos que o Brasil ainda pode tomar. Vale a pena escutar o álbum “Burguesia (1989)” disponível em vinil (duplo), CD, Deezer e Spotify.

 

 

Até a próxima Crítica Musical.

Crítica Musical é publicada neste espaço toda quinta-feira

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