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Crônica: Desarranjo climático

Belo Horizonte saiu do forno e foi direto para as gavetas do refrigerador. Não deu tempo nem de o mercúrio dos termômetros descer, e em poucas horas a temperatura despencou de sufocantes 35 ºC para míseros 15 ºC, como uma simples mudança repentina de humor. E assim a primavera chegou – desequilibrada. Abrindo as portas do verão e embalada por um vento frio de inverno. Foram-se então três estações. Em três dias. Gripemos.

 

Nem mesmo a garota do tempo acertou na imprevisão. Embora o que esteja por trás da desordem do tempo todo mundo sabe — uma tragédia anunciada. Foi o que levou milhares de pessoas às ruas na semana que passou. Jovens estudantes e crianças do mundo inteiro que exigiam dos adultos — bebês grandes e inconsequentes — medidas urgentes para conter o aquecimento global.

 

Eu não protestei nas ruas. Mas escrevi no Twitter. E me senti o presidente da República. Presidente que parece ter sido mordido pelo bichinho da negação. Nega as estatísticas do desmatamento, nega os métodos científicos e nega os efeitos da mudança climática. Nega a floresta Amazônica, nega o inegável e nega a si mesmo, pois é a própria negação.

 

Para ele, essa história de aquecimento global não passa de um mal-entendido — é coisa de comunista. E quem apareceu com uma explicação técnica foi o ministro das (más) Relações Exteriores, no início do mês.

 

Segundo ele, o imbróglio em torno do aquecimento do planeta ocorre porque as estações climáticas antes ficavam no meio do mato. Agora, estão à beira do asfalto. “É óbvio que vão registrar temperaturas mais elevadas”. Eureka! O chanceler mereceria o Prêmio Nobel pela descoberta — se não beirasse o tosco.

 

Outro ministro deu bola fora. Dessa vez, foi o do Meio — hoje, o meio do meio do meio — Ambiente, que ficou de fora da reunião do clima da ONU. É que ele não tinha propostas para expandir as metas do Acordo de Paris. E foi cortar o cabelo.

 

No dia seguinte, foi a vez do presidente falar para os líderes internacionais. E não perdeu a oportunidade de brigar com o resto mundo. Disse que esse negócio de chamar a região com a maior biodiversidade do planeta de patrimônio da humanidade é falácia. E o tempo fechou na ONU. Ficou um climão. Até que todos sentiram dor de barriga e precisaram sair. Soube-se então que nacionalismo barato causou um desarranjo climático na comunidade internacional.

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