Filme: Lion: Uma Jornada para Casa
Ano: 2017
Gênero: Biografia
País: EUA, Austrália, Reino Unido
Diretor: Garth Davis
Trailer:
Assim como eu, muita gente ama filmes baseados em histórias reais. Talvez porque eles carregam consigo a veracidade, o concreto, o efetivo… Eu acredito até que nos emocionamos muito mais com essas brutas verdades estampadas em nossa cara. São muito mais interessantes, prendem mais nossa atenção, já que não são frutos da imaginação de ninguém, mas da realidade propriamente dita. Assisti a “Lion: Uma Jornada para Casa” já sabendo da sinopse, já tendo visto o trailer, já tendo comprado o livro da história para presentear minha irmã Ana Paula – e morrido de vontade de ler primeiro – e, mesmo assim, eu me emocionei do início ao fim. Um drama daqueles que expõem a vida de uma família comum e que nos fazem refletir no quão improvável e surpreendente pode ser uma história verídica. A delicadeza e a sensibilidade do estreante diretor Garth Davis são de se aplaudirem de pé e mostram por que ele foi indicado em seis categorias do Oscar 2017.
O filme conta a história do menino Saroo (incrivelmente vivido pelo carismático ator mirim Sunny Pawar, cuja expressividade realística é de se espantar). Ele se desencontrou de sua família aos 5 anos, ao sair de casa com o irmão Guddu (Abhishek Bharate, outro que convence em cena) em busca de trabalho para auxiliar a mãe nas despesas do lar, já que eles vivem em meio à pobreza indiana. Perdido em uma estação ferroviária, Saroo acaba dormindo em um vagão e acorda com o trem em movimento, desembarcando em Calcutá, a 1.600 km de sua cidade natal. Ao desembarcar, o garotinho ainda enfrenta o desafio de não conseguir se comunicar com quase ninguém, por falar apenas hindi e não compreender bengali, o idioma local. É desesperador ver um ser tão mínimo defronte à infinitude do meio urbano da Índia. E o diretor de fotografia do longa, Greig Fraser, soube expor essa grandeza na tela muito bem. As várias tomadas aéreas são surreais. E a cena em que o garotinho está perdido no meio da multidão, numa estação de Calcutá, onde ele sobe num poste pra tentar enxergar melhor e gritar pelo seu irmão, é agonizante.
Após ficar semanas perdido e apesar de todas as dificuldades, Saroo consegue sobreviver até ser encontrado por um centro de crianças abandonadas e, posteriormente, ser adotado por Sue e John Brierley, um casal australiano vivido por Nicole Kidman e David Wenham. O tempo passa, e, 25 anos depois, vivendo na Tasmânia com a família adotiva, Saroo (Dev Patel) começa a ter algumas reminiscências do que se teria passado no dia em que ele se perdeu da família. Desolado, mas com uma necessidade imensa de descobrir suas verdadeiras origens, ele mergulha de cabeça entre pesquisas e probabilidades do Google Earth, em que só a esperança se sobressai, como um alimento pra alma, um sopro de energia no presente em uma vida de um passado esquecido.
O que seria de nossas vidas se não fosse esse fiozinho de esperança, né? Por mais que essa parte do filme seja lapidada muito que rápido e instantaneamente, dá-se a perfeita ideia da revolta e do descontrole do jovem quando ele percebe que tem uma vida boa, mas se aflige pensando no que pode ter acontecido com sua pobre família. Ao cair a pesada ficha, como viver sob essa sombra do passado atormentando a memória? Só resta a esperança, por menor que ela seja, por mais inacreditável que possa ser esse reencontro.
Saroo se veste de crença, confiança e fé e vai em busca do que quer. Mas Victor Hugo já disse uma vez: “A esperança seria a maior das forças humanas se não existisse o desespero”. Voltaire também refletiu: “A esperança é um alimento da nossa alma ao qual se mistura sempre o veneno do medo”. O desespero e o medo existem, sim, no filme e na vida real. Mas o que seria da vida e dos roteiros reais e surreais do cinema se, segundo Charles de Gaulle, neste mundo, “o fim da esperança é o começo da morte”?
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