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A Favorita, o poder e o favoritismo feminino, com 10 indicações ao Oscar

 
 
Imagine uma rainha descontrolada, melosa, infeliz, emburrada, chorona e infantil. Quer mais adjetivos? Louca, trágica, medrosa, intensa, tola e agonizante. E ainda tem mais: insegura, escandalosa, histérica, carente e dramática. São essas as “qualidades” da rainha Anne, que reinou a Grã-Bretanha entre 1707 e 1714, durante as guerras da Inglaterra contra a França. Com um show de interpretação da atriz Olivia Colman, a rainha Anne, com seu temperamento desenfreado, é o mote do filme “A Favorita”, que estreou nos cinemas e tem reunido prêmios e indicações por aí – o longa, inclusive, junto com “Roma”, de Alfonso Cuarón, foi o grande indicado no Oscar 2019, que acontece no dia 24 de fevereiro: cada um concorre em dez categorias.
 
 
A produção, que tem liberdade poética e conta só os bastidores (as fofocas mesmo) da corte inglesa, é exclusiva e excentricamente feminina. Além de Anne, a produção do diretor Yorgos Lanthimos apresenta duas outras personagens que disputam o cargo de “A Favorita” da rainha: Lady Sarah Churchill – duquesa de Marlborough (Rachel Weisz), que tomava as rédeas do reino com extremo vigor, principalmente quando Anne estava mais fragilizada de saúde, e influenciava nas decisões mais importantes do país; e Abigail (Emma Stone), a jovial prima distante de Sarah, que chega ao palácio de forma tímida em busca de emprego e, pouco a pouco, com muita astúcia e firmeza, fica próxima da rainha, ameaçando o favoritismo da prima.
 
 
 
 
 
 
Não há espaço para homens na história contada. Tanto que a rainha era casada com o príncipe George, da Dinamarca, e ele nem aparece no filme. Os homens ali são totalmente secundários, até alvos de chacota, inclusive em cenas belíssimas que mostram figurino, acessórios e maquiagem deslumbrantes, impecáveis. Tudo opção do roteiro, que prefere focar a tumultuada vida particular de Anne e suas relações com Sarah e Abigail. Pra mim, um exímio novelão inglês centrado entre as quatro paredes do quarto real e que realmente funciona. O uso contínuo de lente grande angular, tipo um olho mágico, faz com que o espectador se sinta como se estivesse dentro dos aposentos reais, o que o torna ainda mais carismático e instigante, numa ideia de realmente ir fundo nesse universo-bolha.
 
 
E, dentro dessa disputa feminina empoderada, a comédia dramática vai além: por mais que o foco seja a rainha (e Olivia Colman seja a favorita a levar o Oscar de melhor atriz pela brilhante atuação), as duas eleitas da rainha também têm seu enorme destaque – tanto que, de forma curiosa, as duas atrizes, Rachel Weisz e Emma Stone, foram indicadas como melhor atriz coadjuvante trabalhando no mesmo longa. E vale ressaltar a inversão de valores entre as duas no decorrer da produção: de vilã a queridinha, e vice-versa. É incrível como essa transição acontece de forma natural. Quando vê, já estamos tendo pena de uma que odiávamos e abominando a que amávamos. Na disputa pela atenção da rainha, as primas rivais oscilam entre a doçura e a agressividade, a amizade e a manipulação de forma encantadora. Entre ameaças, disputa de egos e vaidades, exibição de poder e diálogos riquíssimos, o luxo inglês – algumas vezes pomposo, e outras, grotesco e vulgar – é estampado na tela grande. Em tempos de machismo e escrotismo, esse poder luxuoso feminino é um verdadeiro delírio para nossos olhos!
 
 
 
 
“Luiz, Câmera, Ação” é publicada neste espaço toda sexta-feira
 
 

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Charles Douglas
Virginiano, metropolitano de Ibirité, mas com a vida construída em BH, jornalista recém formado e apaixonado pelos rolês culturais da capital mineira. Está perdido no mundo da internet desde quando as comunidades do Orkut eram o Culturaliza de hoje. Quando não está com a catuaba nas mãos, pelas ruas de Belo Horizonte, está assistindo SBT ou desenhos no Netflix.